ORIGEM DA PALAVRA SERTÃO

O SIGNIFICADO DE SERTÃO E SERTANEJO

Litografia do Álbum de Pernambuco e seus arrabaldes de F H Carls, de 1878 – Recife.

As informações inseridas nesse Blog têm por objetivo dialogar sobre a construção de uma identidade sertaneja nordestina brasileira por meio de conceitos lineares e generalidades de fatos históricos que nos permitirão ter uma visão mais ampla do significado da expressão Forró de Raiz. Você pode estar se perguntando: “sertaneja nordestina”? Friso, que para entendermos alguns acontecimentos e conceitos históricos iremos buscar ajuda em outras disciplinas além da história, como: português, geografia, filosofia, musicologia entre outros. Sendo assim, através da etimologia da língua portuguesa chega ao nosso conhecimento que a palavra “sertanejo” é um sufixo da expressão “sertão”, que se refere a uma região afastada dos centros urbanos, distante ou com pouca "civilização"; ou seja, simplesmente, o interior de um país ou região. Significado exposto no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa escrito por Morais e Silva:

“Sertão, s. m. O interior, o coração das terras, opõe-se ao marítimo, e costa… O sertão toma-se por mato longe da costa. O sertão da calma; i. é, o lugar onde ela é mais ardente. Lobo “metendo-se pelo sertão da calma, que naquele tempo fazia”.

Observamos na entrevista dada por Luiz Gonzaga ao jornal carioca “O Globo” em 17 de outubro de 1988, que esse entendimento era assimilado por ele, pois quando o jornalista Marcos Cirano perguntou a Gonzaga se ele tinha descoberto o Nordeste musicalmente falando; Luiz respondeu: 

“Não foi o Nordeste, foi o Sertão. O Nordeste sempre teve os seus carnavais, suas festas tradicionais para exibir as suas canções. Mas, eu esbarrava sempre, no Rio de Janeiro, para vencer, contra tudo e era barreira quase invencível. De vez em quando, aparecia um seresteiro, como Augusto Calheiros e mais alguns, que, através de suas vozes, eles contavam as coisas engraçadas do Nordeste, como Manezinho Araújo”.

Contudo, na pespectiva geográfica alguns etimólogos supõem que foi usado anteriormente pelos portugueses o termo “desertão” (que seria um sufixo no aumentativo do radical da palavra “deserto”) para identificar as condições climáticas das regiões no interior da África, da Ásia e secundariamente no Brasil; ou seja, quando queriam se referir a um local de dificil habitar e grande calor. Sendo assim, os etimólogos  defendem que esse termo começa a ser práticado entre os séculos XVI e XVII durante a colonização do Brasil pelos portugueses; pois houve um deslocamento da criação de gado do litoral, devido à pressão exercida pela expansão da lavoura de cana-de-açúcar, que era o principal produto de exportação da economia colonial. Essa área foi conquistada aos poucos por povoadores com escassos recursos, entretanto, o desenvolvimento da pecuária possibilitou o desbravamento nos sertões. 

Os caminhos de boiadas assim criados permitiram a articulação e o intercâmbio entre o litoral nordestino e o interior, dando origem a diversas cidades. O rio São Francisco constituiu uma via natural de entrada para o Sertão, ampliando a extensão da área envolvida nessas trocas. Em suma, os portugueses chamavam o semiárido de “desertão” pelas condições climáticas, mas com o passar dos tempos, houve um processo de modificação da palavra na boca do povo, pois à sílaba inicial foi desaparecendo ficando só a expressão “sertão”. Ressalto que Helder Guégués informou que tomando o vocábulo no aspecto de relacionar o “sertão” com a ideia de “quentura”, de região “quente”; passou por um processo temporal e logo se configurou na língua portuguesa expressada no Brasil, que sertão significa uma sub-região geográfica, que se estende por grande parte da Bahia, de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Piauí; por todo o Ceará; e por uma pequena parte do Sergipe e de Alagoas. 

Além disso, atinge o norte e o noroeste de Minas Gerais, mais precisamente no Vale do Jequitinhonha; ou seja, essa sub–região predomina mais no Nordeste brasileiro. A caracteristica maior dessa sub–região, é o clima tropical semiárido, que apresenta temperaturas elevadas (entre 24 °C e 28 °C) e duas estações bem definidas: uma seca e outra chuvosa. Alguns historiadores enfatizam que da mesma forma que existiu um processo de modificação da palavra, houve um interpretação do sentido da mesma. Alguns autores portugueses antigos, como: Barros, Mendes Pinto, Tenreiro dentre outros; colocaram a palavra sertão, como adjetivo de interior de lugar. Exemplo: “sertam da cidade” expressão usada por Tenreiro. Assim como, Domingos Vieira “Dentro no sertam desta cidade está outra cidade muito mais nobre…”.  

Assim, inicia-se uma divulgação confusa sobre o significado desta palavra, quando alguns escritores portugueses aplicaram a expressão ao interior das terras africanas, asiáticas, brasileiras e até ao interior de ilhas. Destaco um texto de Fernão Mendes Pinto: “A terra em si é quase do teor do Japão, algo tanto em partes montanhosa, mas no interior do sertão é mais plana…”. Você poderia questionar com a seguinte analise: Se a palavra “sertão” apenas pudesse significar “interior”, a expressão “interior do sertão” seria igual a interior do interior? Os linguistas acreditam que possivelmente houver uma interpretação equivocada outrora sobre o significado do termo – sítio quente com a de sítio interior (região longe da costa). Essa narrativa justificaria o facto dos escritores antigos (como: Barros, Góis, dentre outros) terem usado a palavra sertão como adjetivo do termo sítio, que tinha o significado – longe da costa, onde há grande calor). 

Esse equívoco não determinou a exclusão da ideia de quentura, mas agregou o sentido de localização e atenuou-se a ideia de calma; dando origem posteriormente a expressão sertão da calma (isto é, lugar abandonado, pois o latim desertus parte do princípio de de sero; ou seja, abandonar, deixar). Enfim, dentro da narrativa histórica da etimologia da palavra sertão, ela foi relacionada a principio a ideia de sítio (longe da costa) e secundariamente a expressão sertão da calma – significava que na medida que se caminha para o interior das terras ultramarinas, iria encontrar um lugar solitário de temperatura mais elevada. Por meio deste discurso surgiu a ideia de lugar inculto, silvestre; mas essa é uma outra história. Concluindo, a expressão “sertanejo” passou a significar pessoa que nasceu longe da costa, no interior do país e o termo “sertão” passou a identificar uma sub-região no interior.

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REFERÊNCIAS 

BIBLIOGRÁFICAS
AULETE, Caldas; Valente. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional, 1881.
NASCENTES, Antenor. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional, 1932.
SILVA, Moraes. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa. 2ª ed. Lisboa: Typ. Lacerdina Lisboa, 1813.
 
PERIÓDICOS
NORDESTINO, TRIO. Entrevista na Rede TVE, 1984 – Rio de Janeiro: Realizado no Maracanãzinho.
GONZAGA, L. Entrevista no Jornal O GLOBO, de 17/10/1988 – Rio de Janeiro. Acervo do historiador e músico Salatiel D’ Camarão. 

IMAGEM
Litografia do Álbum de Pernambuco e seus arrabaldes de F H Carls, de 1878 – Recife. Acervo do Museu da Cidade do Recife. 

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